Wálter Fanganiello Maierovitch, Terra Magazine / Sem Fronteiras
Suprema expectativa
“Conta a mitologia grega ter Zeus confeccionado e presenteado Pandora com uma ânfora (vaso). No Brasil, a ânfora virou caixa. A Caixa de Pandora e fim de papo. Quando da sua entrega, Pandora foi advertida por Zeus para jamais abrir a caixa, sob risco de deixar escapar o conteúdo armazenado.
Como Pandora havia recebido de Hermes o dom da curiosidade, desprezou a recomendação de Zeus e, ao abrir a tampa, escaparam todos os males, que se espalharam definitivamente pelo mundo. Nem a despreparada e violenta polícia militar do governador paulista Geraldo Alckmin conseguiria eliminá-los.
Na narrativa sobre a Caixa de Pandora existe uma crítica à curiosidade feminina. No fundo, uma repetição do mito bíblico a respeito de Eva, no Gênesis. Os atos de Eva e de Pandora tornaram os homens mortais. Mas existe uma diferença. Na primeira abertura da tampa da Caixa de Pandora permaneceu, sem tempo de sair, a esperança.
Na véspera do início da sessão de julgamento do processo criminal que ficou conhecido como Mensalão tem-se a impressão que Zeus, conhecido no “bas-fond” da política partidária por Roberto Jefferson, preparou e entregou a Caixa de Pandora ao então procurador-geral Antônio Fernando de Souza, responsável pela sua ruidosa abertura.
Parêntese aberto. A revista CartaCapital, que acaba de chegar às bancas, mostra o Valerioduto repassando ao ministro Gilmar Mendes R$ 185 mil. Parêntese fechado.
Tudo isso transcorreu em clima da CPI dos Correios (2005-2006), de centenas de manifestações do relator-parlamentar Osmar Serraglio e de entrevista de Jefferson à Folha de S.Paulo. Ele — que no momento brada não aceitar condenação e acusa Joaquim Barbosa, ministro-relator do Mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), de buscar “aplauso em botequim”— confessou ter embolsado R$ 4,5 milhões, cuja circulação não foi investigada apesar do forte odor de crime consumado e da regra antirreciclagem do “follow the money”, recomendada pela ONU.
A propósito, nem o bispo Rodrigues, um dos réus do Mensalão, já expoente da Universal do Reino de Deus e acusado de receber R$ 150 mil do Valerioduto, conseguiu o milagre de travar a tampa da Caixa de Pandora tupiniquim. Ao que parece, para o bispo Rodrigues o dinheiro caiu do céu.
Com efeito. O procurador-geral Antônio Fernando de Souza, então chefe do Ministério Público Federal e único legitimado para propor ação penal pública diante de acusados detentores de foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal (STF), denunciou 38 réus e tipificou as condutas como crimes de formação de quadrilha, evasão de divisas, peculato, corrupção ativa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta.
Para esse antigo procurador-geral, Antônio Fernando de Souza, uma quadrilha comandada pelo ministro José Dirceu saqueou os cofres públicos para comprar apoio político de membros do Congresso e ofertar, por interpostas pessoas, numerário para partidos aliados saldarem dívidas de campanha política. Tudo isso, durante o primeiro mandato do presidente Lula que, segundo o delator Roberto Jefferson, nada sabia do esquema nem do núcleo central que seria formado por José Dirceu (ministro), José Genoíno (presidente do PT) e Delúbio Soares (tesoureiro do PT).
Com a Caixa de Pandora aberta por Souza e as suspeitas difundidas por todo o Brasil, seu sucessor, Roberto Gurgel, nos autos processuais e em alegações finais apresentadas em julho de 2011, pediu a condenação de 36 dos 38 réus e selecionou, da lista de males saídos da Caixa de Pandora, um dos piores: “A mais grave agressão aos valores democráticos”.
Na presente quadra, a sociedade civil conta com a esperança de o STF realizar, à luz das provas, um julgamento técnico e justo. Nada de julgamento político, como já fez ao reconhecer ter sido a Lei de Anistia recepcionada pela Constituição de 88.”
Fonte Brasil Brasil